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A Competição do Salto em Altura

Os resultados do primeiro semestre fiscal (Março a Setembro) da Ryanair impressionam, ou talvez não, pela grandeza dos seus números: 95,1 milhões de passageiros, resultando num coeficiente de ocupação de 94%, um volume de receitas que ascendeu a 6,6 mil milhões de euros e um lucro de 1,4 mil milhões de euros, que comparam com os 48 milhões de euros de prejuízos no mesmo período de 2021.

No entanto, é curioso assinalar que o lucro obtido por passageiro transportado pela Ryanair nesse período equivale a apenas 14,4 euros. Tal lucro por passageiro de uma das companhias aéreas com uma das estruturas de custos mais enxutas do mundo é a prova do quão o negócio do transporte aéreo é feito de volumes robustos e de margens magras, em que um conjunto de variáveis exógenas, portanto não controláveis, determinam a ténue linha que separa lucros e prejuízos.

Este é um negócio que se assemelha a uma competição de salto em altura, em que a altura da fasquia é determinada pelo custo unitário ou CASK (Cost per Available Seat Kilometer). O objetivo do atleta, neste caso a companhia aérea, será o de saltar tão mais alto quanto a sua estrutura de custos, influenciada por variáveis internas e externas, o determinar, com uma margem suficiente acima da fasquia. A altura do salto é medida pela receita unitária ou RASK (Revenue per Available Seat Kilometer), a qual é o produto entre o coeficiente de ocupação (Load Factor) e o preço pago por quilómetro por cada passageiro transportado (Yield). Ou seja, a altura do salto resulta da combinação entre a quantidade e o preço:

    RASK = Load Factor x Yield

Na atual conjuntura inflacionista e de elevado preço do combustível, a fasquia (CASK) sobe para todas as companhias aéreas, sejam de baixo custo ou não, obrigando a um consequente salto (RASK) mais elevado. Talvez por isso se entendam as palavras de Michael O’Leary quando disse que “a era dos voos a 10 euros acabou”. Num contexto económico de custos mais elevados, uma companhia aérea que praticamente já vende toda a sua capacidade, não tendo, portanto, margem de manobra significativa para aumentar o volume (Load Factor), só poderá continuar a disponibilizar retornos expressivos aos seus acionistas caso aumente a sua receita unitária (Yield), quer através do aumento direto dos seus preços quer por via de práticas de yield management e de captação de receitas auxiliares mais agressivas.

É o que se tem verificado de forma transversal. O yield global deverá subir 5,1% em 2022, depois de ter subido 3,8% em 2021. Isto é ainda mais assinalável quando se sabe que o segmento corporativo está mais longe de recuperar os seus níveis pré-pandemia. Ou seja, o aumento médio para aqueles que viajam em lazer é superior a esses 5,1%.

Esta será uma tendência que deverá manter-se por mais algum tempo, pois as ameaças que pairam sobre a indústria continuam bem presentes: o financiamento está mais caro, a inflação pressiona o aumento dos custos laborais, o combustível que representa 24% dos custos das companhias aéreas está cerca de 40% mais caro e o câmbio do dólar americano, que afeta muitas companhias aéreas, nomeadamente as europeias, atingiu o valor máximo dos últimos 20 anos quando se compara com o euro. Não menos relevantes são os custos adicionais para ajudar a mitigar as emissões de CO2 e os decorrentes dos conflitos geopolíticos.

Adicionalmente, como dito antes, o salto do atleta também é determinado pelo volume de passageiros. Entende-se por isso a preocupação do sector em atingir rapidamente os volumes pré-pandemia. Na Europa, em 2022, estima-se que a procura atinja 82,7% e a capacidade 90% das registadas em 2019.

Todos os fatores apontam para uma fasquia colocada numa posição mais elevada que os atletas procurarão minimizar com dietas feitas à base de ganhos de eficiência. Porém, com tantas e ameaçadoras variáveis que não controlam, tal poderá mostrar-se insuficiente, resultando num acelerar do processo de fusões e aquisições na indústria que funcionem como a proteína necessária para selecionar os atletas que permanecerão em competição e torná-los mais robustos e mais bem preparados para saltos suficientemente altos que os conduzam ao almejado sucesso.

Carlos Paneiro

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