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O “Hub de Lisboa” e a privatização da TAP

Muitos foram os que ficaram surpreendidos com os prazos mencionados pelo Primeiro-Ministro para a concretização de dois difíceis dossiers que o seu governo tem em mãos: a decisão sobre a estrutura aeroportuária de Lisboa e a privatização da TAP.

Se, por um lado, surpreendeu o fato de, “só daqui a um ano é que o Governo poderá anunciar a localização do novo aeroporto de Lisboa”, após décadas de projetos e discussões acerca do esgotamento da capacidade do aeroporto Humberto Delgado, por outro lado, não menos surpreendente foi a divulgação, feita no recente debate parlamentar, de que o Governo “espera que a privatização da TAP SA, hoje 100% do Estado, ocorra nos próximos doze meses”, algo que não se esperava que pudesse acontecer tão cedo.

Independentemente do quão exequíveis são os prazos de ambos os projetos, importa entender a lógica do que irá acontecer com a TAP antes da decisão sobre que tipo, onde e se o país necessita do que muitos apelidam de “Hub de Lisboa” e, consequentemente, quanto os contribuintes irão pagar sobre uma estrutura que, no caso do eventual novo aeroporto de Alcochete, diz-se, poderá ultrapassar os 10 mil milhões de euros, incluindo acessibilidades e outras estruturas complementares.

Sobre a questão do hub deve-se esclarecer que nenhum hub pertence a um aeroporto ou cidade, mas sim às companhias aéreas, que, em primeiro lugar, decidem operar sob o modelo de ligações Hub & Spoke, e, em segundo lugar, decidem em que aeroporto, ou aeroportos, optam em basear a sua estrutura de rede.

Seguindo essa perspetiva, Lisboa não tem nenhum hub. Quem tem um hub é a TAP que faz do aeroporto Humberto Delgado um centro de ligações entre continentes. Ou seja, Lisboa é o hub da TAP e só haverá um hub em Lisboa enquanto a TAP, ou qualquer outra companhia aérea que ocupe o seu espaço, decidir que é em Lisboa que pretende manter ou instalar a base da sua rede. Em teoria, qualquer aeroporto do país pode ser um hub desde que tenha capacidade para isso e tenha um cliente, leia-se companhia aérea, que opte em aí basear a sua rede de ligações. Se, por exemplo, a TAP decidisse mudar o seu centro de operações para o Porto, no quadro atual deixaria de haver hub em Lisboa.

O mesmo acontece por todo o mundo. Madrid só é hub por causa da Iberia. Em Paris existem dois grandes aeroportos internacionais, Charles de Gaulle e Orly. Só o primeiro é hub, porque é aí que está o centro de operações da Air France; não existe nenhum “Hub de Paris”. Nenhum dos aeroportos de Berlim, capital da Alemanha, é hub. Os hubs na Alemanha são os da Lufthansa, localizados nos aeroportos em Frankfurt e em Munique, onde os decidiu instalar.

Veja-se ainda o exemplo do aeroporto de Viracopos, em Campinas, São Paulo. É um hub porque a Azul assim o decidiu. Não existe nenhum hub de Viracopos. Existe sim o hub da Azul localizado no aeroporto de Viracopos.

Assim, antes de se decidir sobre a futura solução aeroportuária de Lisboa, fará todo o sentido aguardar sobre o que acontecerá com a companhia aérea que faz de Lisboa o seu hub. Havendo a intenção de a privatizar a 100%, importa de sobremaneira saber se a TAP continuará a operar sob o modelo Hub & Spoke, se continuará a fazer de Lisboa o seu hub e, em caso afirmativo, que dimensão pretende dar ao mesmo. Será um hub de conexão entre a Europa, África e as Américas? Será “só” um hub entre a Europa e o Brasil? Será um hub entre o Sul da Europa e as Américas? São os seus futuros acionistas que poderão responder a tais questões que impactam diretamente no número de passageiros que passam pela estrutura aeroportuária e que permitem determinar qual a dimensão da mesma

Para além de outras variáveis não menos importantes, como política ambiental, comboio de alta velocidade, futuro do transporte aéreo, evolução do tipo de aeronaves, táxi aéreos, etc., nenhuma decisão sobre a estrutura aeroportuária que serve a região de Lisboa deverá ficar fechada sem conhecimento do que irá acontecer com a TAP e o seu hub, a menos que a capacidade do aeroporto Humberto Delgado esteja esgotada ou venha a estar esgotada a médio prazo mesmo sem a existência desse hub.

Ainda assim, porque a decisão do eventual novo aeroporto passará por um forte investimento dos disputados recursos públicos, tal não poderá ficar exclusivamente dependente dos interesses do acionista privado de uma companhia aérea. Portanto, é de extrema importância que o Governo defina as condições de venda da sua companhia aérea, considerando a estrutura de rede, dimensão e localização do hub que precisa “impor” aos futuros acionistas, para então decidir sobre e dimensionar o investimento numa nova estrutura aeroportuária que sirva a região de Lisboa, caso esta venha a confirmar-se ainda necessária.

Carlos Paneiro

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