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O parecer e o ser – terminou o tempo das low costs?

Estes são tempos em que sobressaem, leia-se economizam, clientes atentos e disciplinados. Os que sabem comprar o que realmente precisam ou valorizam, independentemente do tipo de companhia aérea que optam.

Por norma as LCCs (low-cost carriers) oferecem o melhor preço para o pacote básico de uma passagem aérea. Aquele preço que lhes permite aparecer em destaque nas diferentes plataformas de distribuição e nos faz pensar como o transporte aéreo está acessível. Esse preço é o isco que esconde o anzol que agarra o cliente e o faz entrar para uma loja cujos produtos ou serviços adicionais podem encarecer significativamente o custo da viagem.

Recentemente realizei uma viagem não planeada a Austin. Quando peguei no laptop para efetuar uma busca das opções de preço entre Newark/NJ e aquela cidade do Texas, tinha já assumido que a Spirit Airlines ofereceria o preço mais económico.

Assim foi. Essa ULCC (ultra low-cost carriers) aparecia em primeiro lugar, isto é, com o preço mais baixo, nas várias OTAs e metasearchers que consultei para o percurso e data pretendidos. Pensei que seria a minha primeira viagem na airline norte-americana dos aviões amarelos. Porém, dado que necessitaria de viajar com uma mala de porão, constatei, após realizar o moderno bundle, que o preço da mala seria mais elevado do que o preço inicialmente oferecido para a passagem aérea, mais do que duplicando o preço dessa viagem.

Seguidamente, consultei o preço para uma mesma viagem, mas com uma mala de porão, nas chamadas companhias aéreas tradicionais. As tais que têm fama de ser mais caras. Surpresa. A United Airlines oferecia o preço mais competitivo. Ainda assim, verifiquei no seu site que o pacote que incluía uma mala de porão, e que também incluía a possibilidade de reembolso, tinha um diferencial de preço superior ao de uma mala comprada antecipadamente de forma avulsa. Resultado: deixei a ULCC para trás e comprei na United o bundle que efetuei – passagem aérea básica e uma mala de porão – em vez do menu proposto no site da companhia aérea.

Vem isto a propósito de um artigo publicado na quarta-feira na secção travel do The Telegraph, assinado por Nick Trend, com o curioso título “British Airways is finally beating Ryanair on price”.

Interroguei-me: “será que quando há cerca de um ano o Michael O’Leary afirmou que acabou o tempo dos voos a dez euros queria também dizer que acabou o tempo das LCCs?”

Da leitura desse artigo entende-se as razões do autor. De uma busca de preços que fez para uma viagem de ida e volta para Veneza, com partida de Londres, para aproveitar as habituais promoções oferecidas para viagens em Novembro, obteve: EasyJet £50, Wizz Air £39, Ryanair £56 e British Airways £135.

Contudo, dado que o Nick pretendia viajar com uma mala no porão, o que parecia barato tornar-se-ia caro. Os preços das três LCCs permitiriam viajar apenas com uma minúscula mala de cabine. As tarifas que incluem uma mala normal de cabine mais que duplicam o preço. E as que permitem o transporte de uma mala de porão são, obviamente, ainda mais caras.

Conclusão: os preços dessas três LCCs sairiam mais elevados que as £135 da British Airways para uma tarifa que permite duas peças de bagagem de cabine (uma mala com dimensões normais e uma mala de mão ou mochila que caiba debaixo do assento da frente), e até que as £159 que a dita companhia aérea de bandeira inglesa cobraria pela tarifa que inclui uma mala de porão.

A idênticas conclusões poderíamos chegar no caso de modificarmos a busca para um destino de neve, cujo passageiro viaje com o seu kit de esquiar, ou caso o destino seja o nosso Algarve e o respetivo cliente não prescinda de voar com os seus próprios tacos para jogar golfe num dos muitos fantásticos campos que aí encontra.

Obviamente que estes casos não permitem concluir que sempre que se adicionam itens de bagagem os preços das chamadas companhias aéreas tradicionais tornam-se mais baixos do que os da LCCs. Há um conjunto vasto de variáveis que interferem nos preços desta indústria cuja volatilidade é diária. Mas não deixa de ser uma evidência que as técnicas de retalho são cada vez mais sofisticadas e que os preços entre as LCCs e as companhias aéreas de rede tendem a aproximar-se na medida em que se adicionam serviços ou produtos ao pacote básico.

Hoje, o pricing das companhias aéreas baseia-se no princípio de que cada cliente, ou passageiro, é único e cada um tem as suas próprias necessidades: one size doesn’t fit all. É um catálogo de serviços ou produtos em que cada cliente opta e paga pelos que pretende ou valoriza, não tendo de pagar pelos que não vai usar. Pode comprar a tarifa mais básica e ir adicionando serviços e/ou flexibilidades à sua escolha: bagagem de cabine, bagagem de porão, escolha de lugar, embarque prioritário, acesso aos lounges, refeições e acesso a WI-FI a bordo, flexibilidade para mudança de voo, possibilidade de reembolso, etc. Mas também pode optar por um dos pacotes já montados. Tipo menu de restaurante McDonalds.

Sem questionar que as LCCs revolucionaram o conceito do transporte aéreo e contribuíram decisivamente para o desenvolvimento turístico de muitos destinos, sou de opinião que só existe o conceito LCC até ao momento da compra e caso o passageiro viaje com o pacote mais básico oferecido. No tempo que medeia entre a compra e a viagem, todas as companhias aéreas, LCCs e as chamadas tradicionais, esforçam-se por incentivar o cliente a comprar serviços ou produtos adicionais, podendo o preço final da viagem tornar-se bastante mais elevado do que o da compra inicial. É nestes serviços ou produtos, que contribuem para a chamada Ancillary Revenue, que as companhias aéreas conseguem engrossar as suas receitas e, consequentemente, as suas margens. Estima-se que este tipo de receita tenha representado, em 2022, cerca de 15% da receita global da indústria e entre um terço e metade da receita das principais LCCs. E estas percentagens continuam num ciclo de crescimento acentuado.

Estes são tempos em que sobressaem, leia-se economizam, clientes atentos e disciplinados. Os que sabem comprar o que realmente precisam ou valorizam, independentemente do tipo de companhia aérea que optam. Inversamente, quanto mais a sua compra inicial for equivocada, mais irão despender até ao momento da conclusão da viagem.

São, também, tempos em que os agentes de viagens, como especialistas que são, podem sobressair como verdadeiros gestores de viagens, capitalizando nas poupanças que podem proporcionar aos seus clientes ao ajudá-los a navegar neste mar de opções.

Carlos Paneiro

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