O processo de gestão de receita de uma companhia aérea assemelha-se a um funil.
Através da aplicação de táticas de venda com o objetivo de conquistar quota de mercado e maximizar a receita vendida em cada mercado emissor, a equipa de vendas alimenta o funil. Enquanto isso, a equipa de revenue (ou yield) management, por meio de aplicação de um conjunto de princípios analíticos que tendem a prever o comportamento da procura, busca encontrar o ponto perfeito de equilíbrio entre o load factor e o yield maximizando o volume de receita voada de cada voo; a tal saída do funil.
A diferença entre os diâmetros da entrada e da saída do funil é tanto maior quanto mais forte é a pressão da procura. É o que observamos nos tempos atuais pós-pandemia. A procura é tão forte, apresentando um comportamento tão desafiador do presente contexto macroeconómico, que, em linguagem antiga de merceeiro, as equipas de vendas não precisam de vender. Basta “aviar” lugares de avião.
Enquanto isso, os revenue managers selecionam as tarifas ou reservas que a cada momento da vida do voo mais contribuem para o resultado. Ou seja, colocam a fasquia do preço tão mais alta quanto possível, atendendo às elasticidades de cada mercado.
Com a oferta já a níveis de 2019, esta é uma conjuntura de sucesso para ambos – sales e revenue managers.
Porém, o movimento a que assistimos de algumas companhias aéreas diz-nos que esta aparente realidade perfeita do lado da receita não é ainda suficiente para otimizar as suas margens operacionais.
Conforme notícia publicada no Presstur na passada quinta-feira, a United Airlines vai retirar a sua tarifa económica básica para voos domésticos e internacionais de curta distância dos canais tradicionais de GDS. Há alguns meses, a American Airlines anunciou que retirou 40% do seu conteúdo dos GDS tradicionais, terminou com alguns contratos de comissões e reduziu drasticamente a equipa de vendas direcionada às agências de viagens.
O objetivo das decisões de ambas as companhias aéreas é o mesmo: reduzir custos de distribuição e aumentar o volume e o peso das suas vendas diretas. Dito de uma forma mais crua, ambas as companhias aéreas afirmam que não necessitam dos canais de distribuição tradicionais, incluindo as OTA, para vender o que elas vendem, ou “aviam”, nos seus canais de venda direta a um custo mais baixo.
Neste contexto, em que a segmentação ganha ainda mais forma, salva-se o segmento corporate, que é aquele cuja receita unitária é maior, que mais necessita de ser fidelizado e que mais contribui para as margens operacionais. É neste segmento que as companhias aéreas tradicionais concentram os seus recursos, leia-se comissões e força de vendas.
Para além desse, também a venda de grupos e a venda de espaço disponível de avião para operações não regulares ou charters são segmentos de negócio em que ainda se exige uma abordagem comercial mais próxima da tradicional.
Perante tais movimentos das companhias aéreas tradicionais, questiona-se como irão as agências de viagens dedicadas ao segmento de lazer reinventar-se e se tal contribuirá para um fortalecimento da posição dos tour operators que poderão intensificar os seus esforços, individualmente ou em conjunto, no sentido de lançar mais operações charter e, assim, verem diminuída a sua dependência do transporte aéreo regular.
Também se questiona se este movimento das companhias aéreas será feito sem retorno ou sobressaltos, nomeadamente quando o ciclo da procura vier a inverter-se e a pressão voltar a pesar sobre as equipas de vendas para alimentarem o funil da receita e sobre os revenue managers quando voltarem a precisar de tarifas de baixo yield para maximizarem a receita de cada voo.
Carlos Paneiro